segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

Mysen, 4 Fevereiro 08

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Hoje descobri ser o melhor psicólogo da CT! Pois sou o único. Achei interessante o facto desta CT funcionar bem como funciona, apesar de ter um funcionamento em tantas coisas distinto das nossas em Portugal. Acho importante, obviamente, o papel do psicólogo, e de pessoal treinado e especializado, mas o papel de profissionais que já passaram pelo mesmo caminho também me parece ser importante. Agora, qual o melhor? Posso dizer que o melhor seria um equilíbrio entre ambos. Mas pensando na quantidade de psicólogos no desemprego que há em Portugal, até que ponto seria justo serem ainda menos considerados? Não sei… mas por outro lado, se é realmente uma mais valia, devemos ter em conta mais emprego para psicólogos, ou melhores probabilidades de recuperação? E mesmo assim, os toxicodependentes também são pessoas, que precisam de trabalho, não necessitando propriamente de viver para sempre com o estigma da droga. Não sei se percebem exactamente o que quero dizer. São apenas reflexões, e se pensarmos bem, contra mim falo, de certa forma. Não que esteja a incorporar a filosofia desta casa como um dogma, simplesmente estou a incorporá-la como algo que serve para reflectir, e questionar.

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De manhã tive uma reunião de cerca de duas horas com o T1. Gosto dele. É com quem vou trabalhar os primeiros dois meses, encarregue da primeira fase (Motivação) dentro da Fase 1. Falamos do que vamos fazer mais ou menos ao longo destes tempos. Vou participar em todas as reuniões, seja com a equipa, ou com os residentes (reuniões de casa, seminários, de passagem de fase, etc); reuniões fora da CT; visitas à prisão para avaliar tratamentos e afim (disse-me que era um pouco à margem da CT, mas eu disse que iria na mesma); e intervenção no processo de selecção de utentes. Diz-me ter vindo a fazer tudo sozinho, e tem corrido bem, mas é humano, e pode errar, e é sempre bom haver alguém com quem discutir e partilhar ideias. Avisou-me que seria quase tudo em NR, mas que me daria sempre, no final, um briefing do que se tinha passado. Eu expliquei-lhe que, apesar do ideal ser numa língua que percebesse, tinha vindo a desenvolver uma espécie de novo sentido, focado na linguagem corporal, que apesar de pouco ajudar, faz com que não fique na escuridão total.

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Foi-me dando alguma luz, também, sobre o sistema de funcionamento da CT, nomeadamente no que diz respeito às informações sobre os utentes. Neste caso, acho que é algo que não muito dificilmente se pode incorporar em Portugal, pois não imagino ser muito caro. Pois se em Portugal temos dossiês onde podemos encontrar toda a informação acerca do utente, neste caso está tudo informatizado. Acede-se ao programa, e depois de se meter o nome de utilizador e a palavra-passe, aparece-nos uma lista de todos os residentes. Podemos refinar a nossa busca, fazendo uma pesquisa avançada. Clicando em cima do nome de cada residente, temos toda a informação acerca do mesmo, como data de entrada, medicação que toma, doenças, droga principal, bem como notas acerca do mesmo (como referir que tem andado deprimido, p.e., ou fez uma brincadeira que não foi bem aceite pelos colegas, etc). Enfim, tudo o que é possível saber acerca do residente, sem o conhecer, está ali. Conta-me que a ideia é atribuir um código a cada um, e fazer uma base de dados nacional. Seguidamente mostrou-me ainda o sistema nacional do serviço de saúde. Pode-se aceder, gratuitamente, e saber a lista de espera para todos os serviços de saúde nacional. Mostrou-me que, por exemplo, para esta CT, a espera era de X (não me recordo) semanas.

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Tem sido muito prestável, sem nunca ser chato, mantendo-me sempre à vontade para sugerir alterações ao meu plano, para fazer perguntas ou outras sugestões. Procurou-me ainda uma escola onde me posso inscrever para fazer uns cursos de NR. Para 2 meses custa cerca de 200€, que é o que a Universidade paga. O pessoal tem dito que estou a aprender rápido, mas por vezes dizem-no “hoje”, quando o que digo foi o mesmo que “ontem”. Ou não estão habituados a ver alguém a aprender a sua língua, ou até estou a aprender bem… não sei…

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Depois do almoço reuni-me de novo com T1, sendo o tema da nossa reunião o mesmo da manhã. Emprestou-me ainda um conjunto de módulos sobre o funcionamento da CT para ler.

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Hoje entrou um utente novo. Num inglês esforçado perguntou-me se era português, dizendo que o seu pai se tinha mudado para o Brasil, onde tinha agora um meio-irmão, razão pela qual comprou um curso de Português. Faz parte das instalações da CT uma sala de aulas, onde vêm professores de fora para ensinar alguns residentes durante a tarde, seja sobre matemática, línguas, ou outros assuntos. Oferecei-me para lhe ensinar, uma ou duas horas por semana, Português, pelo que amanhã vou falar com T1 para saber se é possível.

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Tenho sentido uma necessidade de fazer algo e de me sentir útil. A primeira semana já passou, e cheguei a recear passar o estágio no escritório. Não que quando cá esteja, esteja aborrecido, tenho muito que ler, e o mundo inteiro ao alcance dum cabo de internet, mas não quero estar aqui 6 meses a navegar na internet ou a ler. Não quero estar aqui simplesmente a ganhar dinheiro fazendo o que podia fazer em Portugal. Quero aprender, sentir-me útil, e retribuir a gentileza que todos têm tido comigo. Por falar nisso, hoje ofereci um livro ao orientador. Disse que ele provavelmente acharia que não fazia muito sentido (couro), pois não falava Português, mas que tinha algo para ele. Fui ao meu escritório e ofereci-lhe o livro. Ele gostou e agradeceu. Na dedicatória escrevi “For Tony, a man trying to make the world a better place! Best wishes, Pedro 08” (não é couro).

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Pois hoje fiquei mais descansado, ao ter alinhavado com T1 o plano para toda a semana. Escolho, ao invés de dizer o que farei, contar quando o tiver feito.

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Ah. Ontem o 1 veio dizer-me que talvez tivesse de ter de mudar de quarto. Isto pois viriam residentes novos, e eu poderia passar par um quarto individual, e o meu quarto se transformar num duplo. Ao que parece o meu quarto é duplo, com apenas uma cama. Disse que não havia problema, e não há, claro, mas na verdade não me apetecia muito. Ok, verdade seja dita, se pusessem aqui um colchão, eu até dormia no escritório! Mas agora que estou ali instalado não me apetecia mudar. Mas antevejo essa necessidade. Senão agora (porque acabou por não ser preciso), mais tarde.

24h09

1 comentário:

Catarina M disse...

Estava aqui a ler e vi-te a falar e contar-me isto, na minha cozinha, tique do cabelo e a dizer-me "mas tu és estúpida!"... Enfim. Ah gostei de "sou o melhor psicólogo". Lol. Beijinho.