quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Mysen, 28 Fevereiro 2008

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Hoje fui à Suécia. Não foi propriamente ir a Estocolmo (que até está no extremo oposto)… Sendo Quinta, fomos com os residentes do primeiro estágio tomar café. Ora a Suécia está já ali, e com preços tão abaixo, pelo que lá fomos. Fomos a um shopping, onde fizemos algumas compras e onde acabamos por almoçar… no Burger King. Terceira vez em 5 dias! Mas pronto, nada com que me preocupar, pois hoje fui correr outra vez, hehe!

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Quando chegamos foi a reunião de passagem de fase de 1. Agora percebi como funciona. Quando uma pessoa está em condições de passar de fase, marca-se entrevista para responder ao questionário ASI (Addiction Severuty Indez). A razão pela qual decidem não fazer logo no início é por acharem que, na medida em que muita da informação é “sensível”, pode haver alguma resistência por parte da pessoa em revelar certos aspectos. Assim, passado algum tempo, espera-se que já tenha ultrapassado essa resistência, e as informações surjam melhor. Após esta entrevista, marca-se o dia em que a pessoa apresentará a sua história de VIDA. Ao contrário de como fazíamos em Portugal, onde uma pessoa ia construindo, no papel, a sua história, e posteriormente a lia, aqui, marca-se uma reunião, e aparentemente as coisas vão surgindo. Pedem alguma informação mais objectiva, para dar azo a que a pessoa comece a falar de si, e depois escutam. Ainda não participei em nenhuma, pois só houve uma, se não me engano, e foi numa Sexta em que não estava cá. Efectivamente, estava a achar estranho que se passasse de fase simplesmente respondendo ao ASI… Continuando, após esta reunião, marcam a entrevista. Quando entrei na sala vi Ti e Ts sentadas lado a lado, mas quem estavam sentados no meio, numa posição que sugeria mais liderança eram dois residentes, que, de facto, foram quem conduziu a entrevista. Correu bem, mas não acho que deva colocar aqui as questões. Fiquei com a folha, mas pediram-me para não mostrar a ninguém, pois são as mesmas questões para todos os residentes. Não que seja um “teste”, mas no fundo… é um “teste” – interpretem. Vou continuar a seguir a linha de raciocínio que postula que “ainda que a probabilidade de escrever no blog e algum residente vir a saber através daí seja ínfima, não o vou fazer…”.

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Hoje comecei a sério com as lições que requisitei na biblioteca. Parece-me porreiro. Ainda demorei uns 5 minutos a perceber como aquilo funcionava, mas lá atinei. É bom porque ouço!! Boa! É que já pensei que, das duas uma: ou falo muito melhor do que aquilo que entendo porque tenho aprendido sozinho… ou então é porque é mesmo assim que costuma ser… Sim, talvez seja assim com línguas que não tem nada que ver com a nossa ou com outras que falemos, e seja ao contrário quando tem. Bem, se lerem, podem encontrar algumas semelhanças com o inglês. E tem. Mas isso não faz com que seja mais fácil, porque a maneira como falam coloca tudo noutro nível. E além do mais, é uma palavra aqui… e outra ali… como, por exemplo: we-vi; morning-morgen; can-kan… etc, não me apetece estar aqui a pensar…

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

Mysen, 27 Fevereiro 2008

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O dia de hoje teve os seus altos e baixos…

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Ou melhor… Creio ser mais correcto dizer que teve os seus momentos “normais”, e os mais baixos. Acordei bem, e às 8h estava na reunião matinal, com todos os residentes. Saído desta, como de costume, fui para a reunião de equipa, Às 8h30. Demorou cerca de uma hora, e no final, com um intervalo de cerca de meia hora, tive a reunião com a equipa do Tr, responsável pelas admissões, que durou até à hora do almoço. Como hoje Tk se despedia deste trabalho, o almoço fora antecipado para as 11h, para que assim nos reuníssemos às 12h para prestar uma homenagem a Tk, que aqui trabalhou 5 anos, e para lhe oferecerem umas prendas e palavras de afecto.

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Quando estava na reunião com a “Intakk Team”, ia-me sentindo cada vez mais cansado. Não aquele cansaço que se sente quando doente, mas um cansaço que se acumula lentamente, fruto de estar horas a fio, na terceira reunião seguida, e sempre, sempre a ouvir uma língua que não compreendemos… é dum desgaste incrível. Antes que esbocem algum pensamento em relação às pessoas com quem estou a trabalhar aqui, quero que saibam, como já disse mais que uma vez, que a última coisa que eu queria era que mudassem os seus hábitos, a sua espontaneidade, e falassem em Inglês, só para que o Português, que veio de livre vontade, possa perceber. E desde o primeiro momento que isto expliquei aos meus colegas. Na reunião com a “Intakk Team”, Tr ia-me explicando, de vez em quando, o que estava a ser discutido, mas ainda assim…

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A dada altura diz que eu era forte (tough). E esse pensamento ficou a ser cozinhado dentro de mim, para lhe voltar a pegar mais tarde…

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Depois do breve almoço, reunimo-nos na sala de estar por mais cerca de uma hora. Já estava como estava, e mais 60 minutos, que por vezes pareciam 120, sentado na minha cadeira, a ouvir palavras que, caso percebesse, até poderiam entrar por um ouvido e sair por outro, mas que, neste caso, nem entravam… Acho que talvez seja obrigatório, ou, vá lá, saudável, estes pensamentos e sentimentos, que por vezes nos fazem sentir menos bem, nos fazem pensar “mas que c*%4”ho é que estou aqui a fazer???”; que nos faziam sentir que John Donne estava errado, pois por vezes, realmente, sentimo-nos uma ilha… Talvez sejam esses pensamentos e sentimentos que nos fazem conhecermo-nos um pouco melhor, pois se tudo está bem, e sempre bem, como saberemos como somos quando não nos sentimos tão bem. Agora que escrevo isto, recordo-me da máxima do Fight Club…

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Quando a reunião acabou, estava a pensar sobre esse ser forte que Tr disse. Sinceramente, considero-me, efectivamente, uma pessoa forte. Mas ser forte não é ser infalível. Acho que ser forte está relacionado com, porventura, sofrer, mas não desistir, desde que por determinação e porque é “o que está bem”, e não por mero orgulho. Não está relacionado com não sofrer, ou passar maus bocados, mas talvez mais com a maneira como lidamos com essas experiências…

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Finalmente lavei a minha roupa! Andava a lavar cuecas e boxers à mão todos os dias porque não tinha arranjado um espacinho para o fazer na máquina. A minha hora é ao Domingo, mas numas vezes esqueço-me, e na última alguém se terá enganado e usou a minha hora.

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Além disto, continuei a estudar o meu norueguês, e comecei um curso novo que requisitei na biblioteca há uns quinze dias. Contudo, preciso dum rádio que leia cassetes. Não há problema, simplesmente significa que não posso estudar no meu escritório. Hoje pedi a Tr para voltar a ligar para a escola de NR. Disseram que me enviam os papéis amanhã, e que o curso foi adiado uma semana. Pois isto é bom, já que na próxima Segunda não poderia ir, sendo que vou com a CT aos Jogos Olímpicos de Inverno.

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Acho que, além de todos os projectos que tenho visto, e que têm suscitado a minha curiosidade, me interessaria tirar um doutoramento ou uma pós-graduação em dependências. Vou começar a pesquisar.

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Bem, por hoje vos deixo, abraço.

terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Mysen, 26 Fevereiro 2008

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Caros leitores. Bem sei que me ausentei por um período maior do que o costume, sendo que a cadência tem sido diária. Mas tenho boas razões. Apareceu por aí o fim-de-semana, e antes dele o meu síndrome de Quinta-Feira, que nem sempre me permite escrever, dado o cansaço que sinto por vezes, neste dia.

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Pois Sexta-Feira passou, e avizinhava-se o simpático fim-de-semana. Lembrei-me de perguntar se algum dos elementos da equipa era de Oslo, e quando descobri que Th era, pedi-lhe boleia. Assim poupei os 15 euros que me levariam até à capital. Pela viagem fomos conversando, e ele foi-me contando o seu percurso, a sua VIDA. Como não vive mesmo em Oslo, combinamos que beberíamos uma cerveja em sua casa e depois me levaria ao metro. Essa cerveja acabou por significar 3 ou 4 horas de conversa. Sentados na sua sala, sem televisão, ou sequer música, por ali ficamos. Ele ia-me dizendo que não queria que eu me atrasasse, ao que eu respondia dizendo que estava bem, e que quando estava bem, ficava mais um bocado. Às tantas são 9h, e pergunto se não quer vir comigo à festa na residência da minha anfitriã. Lá fomos, e foi porreiro. Fomos de táxi, e depois ele voltou da mesma maneira e eu por lá fiquei. Na residência estava o pessoal todo de Erasmus, e alguns locais, com quem ia travando conhecimento.

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No dia seguinte a minha anfitriã voltaria para a sua cidade, e eu pus-me a caminho do meu próximo destino, um anfitrião espanhol e uma anfitriã eslovaca. Depois de nos conhecermos, comer alguma coisa, deixei as minhas coisas e fui dar uma volta pela cidade. Ainda não fui pesquisar realmente o que há para ver, através de sites ou afins, simplesmente caminho livremente, encaminhando-me para onde quiser. Quando voltei a casa, bebemos uns copos entre conversas, e depois fomos beber uma cerveja. O anfitrião espanhol ia fazer o turno da anfitriã num bar, a apanhar copos. Fiquei espantadíssimo ao saber que ganham 18 euros por hora, mais gorjetas, a apanhar copos num bar. Em Portugal seria, certamente, 2,5 euros por hora… A noite foi porreira, conheci algum pessoal, e como qualquer noite nórdica, acabou pelas 3-4h da manhã, altura em que voltamos para casa.

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No dia seguinte o pessoal de casa estava ocupado a arrumar a mesma, já que iam mudar de pouso. Não gostavam do senhorio, as condições não eram espectaculares, e pagavam 500 euros por mês. Bem, pensando que 500 euros significam apenas 25h de trabalho, nem acho assim tanto…

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A cabeça estalava um pouco e decidi apanhar o comboio das 14h em direcção a Mysen. Quando cheguei dormi umas horas e depois entretive-me com o “I now pronounce you Chuck & Larry” – não é mau. Dá para rir um pouco. Mas não tinha cabeça para escrever… Assim como ontem, Segunda, também não tinha. Passei o dia todo um bocado cansado, razão pela qual fui dormir às 21h30! Não me lembro de me ter deitado tão cedo. Mas sabia ser necessário para passar a semana bem. O ponto alto do dia foi ter ido andar de karting! Como vou começar a ter, espero (ainda não me contactaram), lições de Norueguês, só pude ir neste dia. Como disse noutro qualquer post, foi tudo pago. Éramos 3, a correr 1h30, alternando de 15 em 15 minutos. Tinham-me avisado que era desgastante e eu, sinceramente, duvidava um pouco. Isto, claro, até sair da minha primeira corrida e quase não sentir os braços! Estas corridas durarão por uma época, sendo 10 equipas (5 de cada vez) a competir entre si. Ontem ficamos em segundo, e poderíamos ter ficado em primeiro, não fosse o português, de cada vez que corria, perder uns preciosos segundos. Eu avisei que nunca tinha corrido, e eles sorriram, dizendo que o que interessa é a diversão. Claro que sim, mas custou-me, nas últimas voltas, em que ia em primeiro, ver o carro número dez deslizar ao meu lado e quase dizer-me adeus. Ok, coisas práticas… o melhor tempo de Tr foi 33.632 segundos numa volta (e o segundo melhor de todos); o de Tst foi de 33.902, e o de Tp (eu) foi de 34.833. Não parece muito, mas até é. E falo dos melhores tempos, não da média. De qualquer maneira, foi muito porreiro. Para festejar, na volta, jantamos no MacDonalds, hehe.

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Hoje, vale a pena referir, de imediato, a prestação de 1 na reunião matinal. Passou hoje para a Fase 2 (depois de um ano de tratamento), por isso sabia que teria de ir ao centro. Veio preparado, e quando chegou a sua vez, abandonou a sala, em que voltou a entrar uns segundos depois, acompanhado dum rádio, que de imediato começou a tocar uma qualquer música que sugeria strip-tease. Assim o fez, e quando tira os boxers mostra uma espécie de fio dental feito com fita adesiva, que deixou toda a gente, incluindo eu, a rir a bandeiras despregadas.

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Às 10h juntei-me, pela primeira vez, ao “Contact-Group”. Todos se sentaram em círculo, e receberam os “Slipps” que tinham escrito. O discurso ia surgindo, e eu ia tendo a habitual dificuldade em acompanhar. Mas percebi que Th pergunta quem quer confrontar quem. Vejo 2 dizer que deseja confrontar 3. Sentam-se frente a frente, 2 agarra a cadeira com ambas as mãos, 3 coloca as suas em cima das coxas, palmas viradas para cima. Vejo 2 a hesitar, respirar fundo, até que, num momento, começa a dizer qualquer coisa que, apesar de não perceber, percebo, aos berros. Sabia que seria assim, mas não estava bem à espera, e acho que até me assustei. Apesar de disfarçadamente, acho que eu era a única pessoa incomodada ali. Natural, nunca tinha participado. É que o ambiente era, para mim, terrível, com 2 a gritar, a sua cara completamente vermelha, e eu sem saber o que dizia. Bem, que não se pense que são meros insultos sem sentido… o que ele dizia, soube mais tarde, e já na altura imaginava, era construtivo, mas a ideia desta actividade é o libertar de sentimentos que não devem ser libertados no dia-a-dia, num ambiente controlado, e onde se pode expor o desconforto. Mais tarde, ao jantar, 3, que tinha sido confrontado, pergunta-me se eu tinha gostado da actividade. Ao responder que sim, ele diz que tinha sido muito bom, neste dia. Percebe-se aqui a dinâmica de tudo isto, pelo facto de a pessoa que foi confrontada (inclusive por mais duas pessoas, de seguida), ter achado que foi um bom grupo…

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À tarde, depois do almoço, tivemos o seminário. Passei-o a estudar Norueguês mas, a dada altura, e para meu espanto, o tema chama-me a atenção, e consigo perceber, a custo e com muita concentração, mais ou menos o que estava a ser discutido. À saída, quando Tr me pergunta o que tinha achado, digo-lhe que me tinha parecido que ele falava, nessa altura, de psicólogos, psiquiatras, e outros profissionais de saúde. Diz que sim, e pergunta o que eu tinha percebido. “Well it seemed that you… were saying… not so good things…” – ele sorri e diz que é verdade. Digo-lhe que de vez em quando sinto alguma resistência em relação a psicólogos ou psiquiatras nesta instituição, e que sinto também que, de certa forma, sinto que se sentem ameaçados. Peço desculpa caso esteja errado, e digo que é, simplesmente, o que sinto. Ele diz que tenho razão, e explica dizendo que a razão pela qual se sentem ameaçados se prende com o facto do governo estar a influencia em demasia, como tirando a CT do sistema de “social welfare”, e passando para “health care”, e outros problemas semelhantes, como impondo regras, leis, que se apropriam, por exemplo, a um hospital, mas não a uma CT. Outra razão é o facto de muitos profissionais de saúde mental interferirem duma maneira perversa que pode influenciar, na negativa, em todo o tratamento e sistema que têm, e que tem tido sucesso. A isto respondo dizendo que nem todos os profissionais de saúde são iguais, e se simplesmente entrevistarem, nem que seja um milhar deles, hão-de encontrar alguém que consiga dar o seu contributo, respeitando o sistema, e respeitando o papel dos ex-toxicodependentes que aqui trabalham, conseguindo assim um equilíbrio, e que tudo corra bem. Ele diz-me “yes, of course, and that’s one of the reasons why it wouldn’t be so impossible for you to work here…”. De seguida, como tantas vezes connosco tem acontecido, continuamos a conversar, começando a conversa em “A”, e acabando em “Z”. Mas fiquei a pensar, por exemplo, que a resistência que se poderia encontrar em relação aos profissionais de saúde, concerteza será muito menor em relação à resistência, em Portugal, em ter ex-toxicodependentes a trabalhar. Estou a falar um pouco de cor, mas… eu próprio sou um exemplo, talvez. Se me perguntassem antes, acerca disto, nem me passaria pela cabeça tal… Todavia, não tardei a perceber o quanto sentido faz. Estou a ter uma lavagem cerebral? Não, os resultados estão à vista.

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Voltei às corridas, e senti um pouco o corpo a queixar-se dos longos dias sem treino. Uma volta bastou para me deixar com a saborosa sensação de casaco que me deixa calmo e relaxado.

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Por aqui vos deixo, meus caros, e até amanhã…

Fotos - Kart











segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

domingo, 24 de fevereiro de 2008