Mysen, 1 de Abril
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Olá caros amigos. Não escrevi ontem pois estava cansado como poucas vezes tive nos últimos tempos… Não, como nunca tive desde que aqui cheguei.
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O que se passa foi que tive de acordar às 6h50! E adormeci perto das 2h. Fui dormir mais cedo que isso, quem sabe por volta da meia noite, mas talvez por nas duas noites anteriores ter-me deitado tarde, e nas consequentes manhãs me ter levantado igualmente tarde, o corpo terá estranhado… A razão pela qual tinha de me levantar tão cedo era o facto de ir, juntamente com Tr, visitar a prisão Bastoy. Assim, depois do banho tomado, peguei no Fiesta, e fui até casa do colega. Troquei de lugar, sendo que ele ia conduzir, e lá fomos. Chegamos a Moss cerca de uma hora e qualquer coisa depois, e aí, após esperar meia hora, apanhamos um barco para atravessar o fiorde. Travessia completada, tivemos de apanhar outro barco. E isto porquê? Porque a prisão é numa ilha! Não tem cercas, não tem nada, a não ser a linha costeira que separa os reclusos do mundo lá fora…
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A prisão é muito porreira, e é a primeira, e única no mundo, prisão ecológica. Isto é, tanto quanto possível, toda a gente que na ilha habita vive com os recursos que a mesma provém! Têm animais, quintas, madeira, etc. Se partem uma mesa, cortam uma árvore e fazem uma nova. Coisas assim. A razão da nossa visita prendia-se com o facto de quererem implementar um sistema tipo CT, senão mesmo uma CT. Este senão tem que ver com uma certa resistência por parte do governo.
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A ilha tem 115 reclusos, e 68 pessoas a trabalhar, sendo apenas uma pequena parte são guardas. Efectivamente, estou quase certo que a dada altura me disseram que por vezes estão apenas 2 guardas na ilha! É uma prisão de baixa segurança, onde chegam pessoas que cumpriram tempo em prisões de alta segurança, e têm apenas dois anos mais para servir. Não vivem em celas mas em casas, e o seu horário é como um horário de trabalho normal, sendo o resto do dia tempo livre. Esse horário de trabalho normal pode ser dividido, de acordo com a vontade do recluso, entre sempre a trabalhar, ou metade a trabalhar, e metade na escola.
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- As pessoas que estão aqui e vão sair, mais tarde vão ser meus vizinhos. E eu quero ter vizinhos que não sejam violentos, agressivos, e que saibam respeitar as outras pessoas – dizia-me o director dos serviços sociais – Por isso tentamos fazer com que essa aprendizagem comece aqui. – ok, porreiro. Tivemos de manhã uma reunião com um recluso que cumpriu o programa aqui, está bem, e quando acabar o seu tempo na prisão, quer fazer o “after-care” aqui na Phoenix. Depois da reunião, do almoço, e da minha visita guiada, tivemos mais uma reunião, desta feita com mais 4 ou 5 pessoas. Aproveitei essa hora e meia para alinhavar uma estória de 12 capítulos em que ando a pensar.
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Visita concluída, apanhamos o primeiro barco, que nos levaria de volta ao continente. Estávamos no segundo barco quando começamos a perceber que eu não chegaria a tempo… e a tempo de quê? – pergunta o leitor. O plano era eu apanhar o Tr em sua casa com o carro da CT, irmos à ilha, e ao voltar, eu apanhava o comboio de Moss para Askim, onde ia ter a aula, e Tr ia para a competição de Kartings. Pois tal não foi possível. Não fiquei triste, pois sendo apenas a segunda aula (de oito), de certeza que o que se passaria era a professora ensinar algumas coisas que eu já sabia, e repeti-las mil vezes, como na primeira. Assim, faltei sem o peso na consciência (uma vez que o atraso foi do barco) e fui com eles para o Karting. Porreiro. Desta vez ficamos em último das cinco equipas participantes. Éramos muitos, e as trocas levam tempo. Sim, sim…
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Pouco antes de chegarmos, Tr pediu-me uma avaliação destes dois meses. Bom, mau, tudo… De bom tinha, honestamente, quase tudo a dizer, e de mau a única coisa em que era fácil pensar era algo que estava relacionado apenas comigo. Refiro-me ao facto de muitas vezes não perceber o que se passa nas reuniões. Após pensar mais um bocado, cheguei à conclusão que também não estava completamente satisfeito em relação à informação que por vezes (não) chega. Disse-o com cuidado, pois não queria ser mal entendido. E na verdade não é algo de que me possa, propriamente queixar, mas que podia, simplesmente, ser melhor. Falo de quando, por vezes chego a determinada reunião e afinal esta não se vai realizar, ou quando há reuniões/eventos extra que acontecem e de que apenas tomo conhecimento no final. O que lhe disse foi que, primeiro, não acontece assim tão frequentemente, e segundo, desde o início que colocava em mim qualquer responsabilidade por algo que corresse menos bem, sendo que me deixaram à vontade, e eu devo procurar as coisas. A isto respondeu dizendo que não precisava de me justificar ou explicar, pois percebia perfeitamente o que queria dizer. Disse ainda que gostava muito da minha atitude, da maneira como era uma pessoa simples sem merdas, hehe.
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Quando chegamos estava cansadíssimo. Tanto que estive uma meia hora na Internet, peguei num filme que estava no armário da sala (The Cider House Rules – fixe) e fui dormir. Ainda assim adormeci para lá da meia noite…
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De vez em quando tenho insónias, não sei bem porquê. Bem, tudo bem, isto não se pode considerar bem insónias, mas simplesmente dificuldade
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Hoje a casa teve um funcionamento diferente. Acontece que todos os técnicos tiveram aconselhamento. E como funciona? Vão todos para um hotel, têm sessões de grupo onde surgem todo o tipo de questões, de forma a resolver eventuais inimizades e seguir
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Fui, a custo, já que mais queria dormir, à reunião matinal com os residentes, e a reunião seguinte, de equipa, contou apenas com estas 4 almas que são os 3 técnicos e o português. Lemos o livro de ponto, onde a última pessoa em trabalha faz o ponto da situação, como normal, e após isto Th esteve a dar o plano do dia. Não haveria Contact Group, mas um seminário, que acabou por ser bastante interessante, sobre agressão e impulsos; aconselhamento entre residentes (dois a dois), e uma reunião de manhã com o grupo Orienteering Out. Durante o tempo que sobrou falamos acerca do funcionamento da casa, e da importância da sua posição enquanto Staff da estrutura. Claro que… durante a tarde aproveitamos parte desse tempo para pregar uma partida de 1 de Abril… à minha mãe! Foi clássica, daquelas para lembrar…
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Não sei como me lembrei… e sugeri. Th ligou à minha mãe, que dava uma aula, dizendo, com voz séria, que tinha-se passado algo comigo, e a dizer para ela se sentar. Depois disse que tinham descoberto que eu tinha consumido drogas leves e que tinham de me expulsar! Lol. Quando peguei no telefone para desejar feliz dia 1 de Abril, disse que até estava a tremer! Ah! Diz-me que quando ele perguntou se estava sentada, esta pergunta se eu tinha morrido. Mãe, um pouco dramática, não?
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Mas deixou-me a pensar. Acho que devíamos fazer mais partidas destas. O susto leva a apreciar mais. Isto é, a ideia de deixar de ter, seja o que for, ou deixar de ter “tão bem”, pode levar-nos a apreciar mais enquanto realmente temos. Como se funcionasse como um despertar. Não sei se me percebem. Não falo neste caso em específico, nem digo para andarmos a dizer às pessoas que alguém morreu e depois, com a maior lata dizer “’Tava a brincar”, mas simplesmente que mal nenhum faria ter mais consciência do que temos e do que não temos…
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